A Académica e o Decano: Perpétua Dedicação ao Alfarrabismo Portuense

sexta-feira, 28 de novembro de 2025

É imperioso contextualizar a Livraria Alfarrabista Académica não só como um estabelecimento comercial, mas como um repositório histórico e patrimonial da cidade do Porto. A sua génese remonta ao ano de 1912, um período de efervescência social subsequente à implantação da República, sendo fundada pelo livreiro Joaquim Guedes da Silva. A livraria, desde logo, firmou-se como um baluarte do livro antigo e raro, cultivando um acervo que se distingue pela especialização em áreas como a História, a Literatura Portuguesa, a Filosofia e a Arte.

Livraria Académica 

​No entanto, a sua resiliente permanência e o seu prestígio atual devem-se primacialmente à figura de Nuno Canavez, cuja biografia se funde indissociavelmente com a da casa. Canavez iniciou a sua peregrinatio profissional em 1948, ingressando na Académica ainda na sua meninice, aos treze anos, exercendo a função de marçano. Esta data marca o início de uma trajectória de mais de sete décadas ao serviço do livro, um feito que o consagra como o alfarrabista em actividade com mais anos de ofício ininterrupto em Portugal.

 

​Com o decurso dos anos e mercê do seu esforço e erudição autodidacta, Nuno Canavez ascendeu de colaborador a sócio-gerente e, por fim, a proprietário. Sob a sua gerência, a Livraria Académica conservou o seu carácter secular, mantendo-se fiel à sua vocação de alfarrabista erudito, onde o volume raro é tratado com veneração. A sua vasta e precisa memória bibliográfica permite-lhe guiar bibliófilos e investigadores através das distintas salas do estabelecimento, que funcionam como uma autêntica cronologia impressa.

​A Académica do Porto, assim, transcende a mera transação comercial; é um locus de resistência cultural e uma homenagem viva à tradição do livro físico, sendo o Sr. Nuno Canavez o seu mais precioso e inestimável custódio.

O Elísio da Navalha: Um Retrato da Barbearia Garrett

sábado, 8 de novembro de 2025

Erguida na malha urbana do Porto, na Rua de Ramalho Ortigão, a Barbearia Garrett inscreve-se no panteão dos "Comércios com História" da Invicta, atestando a perenidade de um ofício que transcende a mera cosmética. A sua génese remonta ao ano de 1958, mercê da iniciativa de Fernando Lopes de Almeida, que concebeu um espaço imbuído de uma estética que evoca a sobriedade e o design dos meados do século XX.

O interior, um autêntico relicário temporal, é marcado pela decoração de origem, onde se destacam as imponentes cadeiras M. Bartholo, peças de mobiliário que testemunharam a passagem de sucessivas gerações de portuenses. Este ambiente familiar, quase museológico, reflecte a arte do barbeiro na sua forma mais clássica, com o espelho a replicar a minúcia do trabalho artesanal da navalha e da tesoura.

A alma da casa, contudo, seria personificada pelo Senhor Acácio Branco, que iniciou a sua jornada profissional na Garrett ainda em tenra idade. Assumindo a propriedade em 1979, o Senhor Acácio tornou-se o guardião desta herança. A sua mestria e a profundeza da sua memória transformaram o salão num repositório de narrativas urbanas, das quais emergem as figuras ilustres que ali se sentaram – notavelmente o lendário treinador José Maria Pedroto, cliente assíduo, cuja ligação ao espaço se perpetua em murais.

A Barbearia Garrett, ao longo de décadas, não apenas aparou barbas e cabelos, mas serviu como um observatório privilegiado da evolução da cidade, mantendo-se como um baluarte da tradição em contraponto à vertiginosa modernidade circundante.